terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Uma vida urbana



Gastown e’ um bairro histórico da cidade de Vancouver, Canada’. Um bairro compartilhado por drogados e sem teto, por jovens millennials, onde circulam muitos turistas. Um bairro cult.
Nele habitam e circulam gente comum, artistas, estudantes, trabalhadores, de várias origens, etnias e nacionalidades, latinos, árabes, muitos asiáticos, chineses na sua grande maioria, 30% da população da cidade.
Em suas ruas e becos, entre edifícios em tijolos e estruturas de madeira, do final de século XIX e início do XX, convivem  diversidades sociais, econômicas e culturais de uma cidade metrópole múltipla, internacional, cosmopolita com 2.500.000 habitantes e um PIB per capita de US$ 44,337.
A Grande Vitória se aproxima de 2.000.000 habitantes para um pib per capita que não chega a US$ 7 000 dólares/ano. .
Nos interiores dos antigos edifícios industriais e armazéns restaurados, jovens moradores ocupam lofts e nos térreos, lojas de móveis, roupas e lembranças turísticas, ateliers e brechós, pizzarias, cafés e salões de beleza, misturam-se `as dezenas ou centenas de moradores sem tetos, jogados nas calçadas, acumulados em tristes filas nas portas de missões religiosas, de hotéis baratos, mergulhados em becos escuros.
Desenganados, desiludidos, desalentados, empurram carrinhos de compras entulhados de coisas, objetos em frangalhos, restos de roupas, embalagens e comidas, consumidos pelas drogas e pela solidão, caminhando curvados apoiados em andadores, homens e mulheres, rostos e gestos cansados, pedem esmolas, apontando aos transeuntes seus copos sujos de papel.
Gastown e’ o sítio original, o bairro onde se originou a cidade de Vancouver, implantada junto ao porto, ponto final da ferrovia Transcanada’, terminada em 1887, que atravessou todo o país, mais de 5 000 km, do oceano Atlântico ao Pacífico, do leste ao oeste.
Neste local, junto ‘as crescentes atividades portuárias, foram se abrigando os novos moradores que buscavam fazer fortuna no Oeste, do ouro, da madeira, das peles, dos negócios de lucros rápidos.
Com a expansão da cidade, inicialmente devido ao comércio com o Oriente e com a segunda guerra mundial, uma parte dos cais, as primitivas indústrias e armazéns, moradores e negócios foram se deslocando para outras localizações e Gastown e seus belos edifícios entraram em decadência.
Um processo de décadas renovou edifícios e vias públicas, atraiu turistas e novos empreendimentos foram ocupando novas ou antigas construções, tornando a região um ponto de atração turística.
Hoje, ao observador descuidado, acostumado com outros bairros ou cidades canadenses, higiênicas e homogêneas, a vida diária em Gastown parece estranha. Ao lado de um café, de uma padaria chic , de pubs e seus usuários descolados ou próximo de uma loja de modernas luminárias, utensílios de cozinha ou roupas da moda, grupos de pessoas se instalam precariamente nas calçadas, mal conseguem erguer seus corpos, dormem no meio de objetos descartados pelo consumo da metrópole.
Mas há poucos indícios de insegurança pessoal, roubos ou violências físicas. O Canada’ tem um dos menores índices mundiais de violência, -Em termos de homicídios, por exemplo, o Canadá inteiro registrou 1,8 mortes  para cada 100 mil pessoas em 2017, enquanto o Brasil chegava a 28,5 assassinatos para o mesmo número de habitantes
Por todo o dia, turistas e moradores enchem as lojas e restaurantes, as happy hours são muito animadas e os finais da semana, mesmo com o tempo frio e a chuva fina de outono, estão sempre movimentados, de grupos de jovens, de casais que buscam se encontrar em um bar ou para degustar um jantar em restaurante da moda.
Como avaliar este ambiente urbano?
Para quem esta’ a três semanas convivendo com estes eventos e lugares, sou possuído por sentimentos ambíguos. E se de um lado me encanta a variedade das ofertas sensíveis, de uma experiência pessoal diversificada, ambiental e eventual, me angustio com a presença destes corpos lançados as ruas, suas faces envelhecidas e olhos sem focos, vagando desajeitados, curvados, desequilibrados pelas ruas, tornados normais aos passantes indiferentes, que se deslocam para o trabalho, os estudos, os entretenimentos.
Não há uma repressão explícita ao uso das drogas e a política pública de redução de danos oferece assistência social e médica, consumo supervisionado, moradia temporária em hotéis e abrigos, muitas deles dirigidos para mulheres agredidas ou desassistidas.
O uso e venda da maconha está liberada em todo o Canada’, podendo ser adquirida livremente desde o ano de 2018.
Desfio os meus olhares surpresos, indecisos, assustados com tanta tristeza e ao mesmo tempo, admirados com tanta diferença e sofrimentos, surpreendidos com os muitos modos possíveis da vida urbana.


Kleber Frizzera
Novembro 2019

domingo, 15 de dezembro de 2019

Portal sul


Portal sul,
do Príncipe

As melhores e as mais visitadas cidades do mundo têm se esforçado, nas últimas décadas, em (re)qualificar os seus espaços urbanos, buscando fornecer, aos seus moradores e turistas, ambientes construídos e naturais que ofereçam um conjunto das seguintes condições mínimas:
1.     Mobilidade pessoal, segura e confortável, permitindo o acesso a todos os setores urbanos, com prioridade aos deslocamentos dos pedestres, das bicicletas e através dos transportes públicos de grande capacidade.
2.    Uma provisão de densidades adequadas, populacional e de múltiplos usos, que propiciem uma variedade de ocupações e apropriações e possibilitem a livre expressão de manifestações culturais, étnicas, religiosas e politicas..                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                             
3.    Uma rede de conecções físicas e virtuais, através de linhas de permeabilidades e interligações dos bairros  e pontos urbanos  de forma a superar e vencer as segregações urbanas de todo o tipo, de ordem social, econômica e ambiental .
4.    A valorização, o destaque e potencialização dos lugares do patrimônio coletivo, artístico e  histórico, das  paisagens naturais, dos usos e costumes tradicionais e das práticas sociais e culturais,  
5.    A articulação de investimentos públicos e privados na produção de edifícios de habitação social, de espaços coletivos, de serviços de saúde, educacionais, de entretenimento e para a instalação de novos negócios e empregos,

Conforme propõem Richard Sennett, no seu último livro, Construir e habitar, e’ preciso pensar uma cidade que atualize cinco formas abertas, sincrónicas, interrompidas, porosas, incompletas e múltiplas, que não esgotem todas as possibilidades de apropriação de experiências produtivas e gratificantes, mas sejam suficientes para a prover e assegurar a presença pública das pluralidades sociais e o estímulo a eventos e acontecimentos  significativos.
Uma cidade aberta deve conter espaços sincrônicos, onde convivem as diferenças, sustenta projetos que criam lugares com determinados valores e particular caráter, mas que devem ser porosos, como uma membrana, que ligue e contate diferentes práticas e comunidades, e que, ao mesmo tempo, sejam deixados incompletos e inacabados, recebendo iniciativas coletivas e abrigando diversidades urbanas, e onde se possa semear um espaço para o máximo de variação, criação e inovação.
O governo do estado anunciou recentemente um projeto para uma área em Vitoria, conhecida como Portal Sul, resultado de aterros, de um braço de mar, e que ligaram a ilha do Príncipe `a ilha de Vitória. Nestes aterros, de mais de quatro décadas, foram erguidos a rodoviária, o parque Tancredo Neves, o Sambódromo, e algumas instalações industriais, como o estacionamento e áreas administrativas da antiga Flexibras, atual Tecnip, junto a ponte seca.
O aumento do movimento de pessoas e cargas, vindas da ponte Florentino Avidos e da segunda ponte, tem impactado negativamente a área, hoje em boa parte com terrenos vazios e construções deterioradas, e tem cobrado dos setores públicos uma solução adequada para a sua reinvenção de formas e de usos, associada `a implantação de modos físicos e tecnológicos para apoiar a mobilidade local e metropolitana.
A iniciativa estadual, neste sentido, neste momento, e’ bem vinda, mas precisa ser avaliada, criticada e discutida publicamente para não perdermos a oportunidade da produção das melhorias urbanas que apontem e ajudem para um futuro de uma cidade menos desigual e mais democrática
Apontar algumas críticas, que explicitem as ausências ou faltas da proposta apresentada, e’ uma pequena contribuição ao debate necessário,  para que se possa rever o projeto, de porte rodoviarista, submetido à lógica do carro privado, se impondo apenas como um meio de passagem de veículos pela área, negando e sufocando algumas potencialidades locais.
Gostaria de destacar as seguintes faltas ou ausências notadas na proposta publicada:

1.    Uma conexão adequada dos dois lados do aterro, ligando e articulando, principalmente para o pedestre, a ilha do Príncipe ao morro do Quadro e do Alagoano, a avenida Alexandre Buaiz `a avenida Santo Antônio,
2.    Uma proposta de expansão e requalificação do mercado da Vila Rubim, lugar tradicional de abastecimento e sociabilidade dos moradores da cidade de Vitória,
3.    A previsão de implantação de um sistema de transporte coletivo de média capacidade, tipo BRT ou VLT, que conecte o centro de Vitória `a Cariacica e Vila Velha
4.    Um proposta de geração de espaços construídos, para abrigarem edifícios de habitação social, serviços públicos e privados, comércios e instalação de novos negócios,
5.    E finalmente uma
qualificação paisagística  e ambiental através da implantação de um parque linear, que ligue o mercado da Vila Rubim `a rodoviária e ao parque Tancredo.

Kleber Frizzera
Dezembro 2019


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terça-feira, 12 de novembro de 2019

As desigualdades sociais e as cidades


Vancouver 1


Os últimos dados publicados pelo IBGE, expuseram o aumento do número de pobres e miseráveis no Brasil, atingindo, em 2018, um total de 13, 5 milhões ou de 6,5 % da população, e confirmando uma crescente e alarmante desigualdade econômica e social. Afirma o renomado economista francês Thomas Piketty, em seu recente livro de 2109, Capital e Ideologie, que quando observadas no período 1980\2018, estas desigualdades sociais econômicas voltaram a crescer também na maior parte dos países e regiões do planeta, se configurando como umas das questões mais inquietantes que o mundo se confronta no século XXI, ao lado dos desafios das mudanças climáticas e dos movimentos migratórios.
Segundo Piketty, os índices e os níveis de desigualdade no Brasil se assemelham aos dos países da África Subsaariana, da Índia e do Oriente Médio, esta sendo a região mundial mais desigual, todos países e regiões onde 1% da população, os mais ricos, tem ampliado a captura da maior parte, acima de 50%, da produção nacional e de eventuais crescimentos econômicos.
Quer sejam estas situações impulsionadas pelas receitas econômicas neo liberais, comprometidas com o capital financeiro, como aconteceu no Chile e na Argentina, ou pela acelerada expansão das novas tecnologias, de gestão, distribuição e produção, que ampliam o desemprego estrutural e o trabalho precário, as muitas desigualdades e a consequente concentração da riqueza tem impactado fortemente a vida nas grandes metrópoles.
Nelas, principalmente nas grandes aglomerações, onde imigrantes são atraídos por melhores e maiores possibilidades de sobrevivência pessoal, e para onde se movem os donos das grandes riquezas em busca de maiores lucros para os negócios imobiliários, as desigualdades e as segregações urbanas tornaram-se mais visíveis e mais trágicas. Centenas de milhares de moradores sem teto ocupam as ruas e praças de cidades, de São Francisco, Nova Yorque a São Paulo e milhões de seus moradores e trabalhadores não tem acesso a uma moradia digna devido ao brutal encarecimento dos custos das habitações, do transporte público e dos serviços públicos básicos.
Embora algumas administrações municipais, como Londres, Vancouver e Paris, tenham tentado criar normas e leis que buscam reduzir ou impedir a pressão dos grandes capitais internacionais na hiper valorização dos imóveis urbanos, deixados vazios `a especulação, ou deslocados para aluguéis de temporada, tipo Airnb, nem sempre conseguiram ampliar o acesso dos grupos mais pobres e mais jovens `as moradias qualificadas e aos melhores lugares e ambientes urbanos.
No Brasil, os que mais sofrem habitam favelas, edificações ou loteamentos clandestinos, compartilham apartamentos cada vez mais reduzidos ou no limites, vivem nas ruas ou em ocupações, enquanto os setores médios se refugiam em condomínios fechados, tornando mais evidentes e visíveis os impactos físicos e sociais que as desigualdades têm gerado nas cidades.
Se somarmos as estas tristes situações, os custos e os tempos gastos na mobilidade diária, no transporte público e as duras condições impostas pelo trabalho precário ou parcial, e’ cada vez mais difícil, difícil imaginar, propor e construir uma vida urbana mais justa, acessível, igualitária e democrática.
Na conclusão de seu livro, Thomas Piketty, ao criticar as justificativas institucionais contemporâneas das desigualdades, nos convida a colocar no centro dos debates atuais a questão da justiça, social, fiscal e climática, da propriedade justa, das fronteiras e da educação justas, e de um desenvolvimento sustentável, através de uma troca de conhecimentos, de experiências, no respeito ao outro, `a diferença e `a deliberação democrática.
Neste quadro de preocupações, as cidades brasileiras, onde habitam mais de 80 % da população nacional, tornam-se necessariamente o campo privilegiado das discussões e disputas dos projetos de sociedade, onde o futuro das condições igualitárias de acesso aos bens materiais e simbólicos urbanos, irão definir as condições plenas da vida comum e extraordinária, de todos nós e da sobrevivência do planeta.

Kleber Frizzera
Novembro 2019

publicado em Movimentoonline.com.br

sábado, 2 de novembro de 2019

Proximidade


Montreal 3
O jornal espanhol El Pais, publicou, em 24 de outubro de 2019, uma reportagem sobre uma longa pesquisa de mobilidade urbana realizada em 174 grandes cidades do mundo, que chegou às seguintes conclusões:
Las ciudades con una movilidad concentrada, o cidades jerárquicas, tienen una mayor calidad de vida. En ellas se usa más el transporte público, se hacen más trayectos a pie, hay menos coches, menos polución, e incluso se atienden mejor las emergencias. En cambio, las ciudades dispersas muestran los niveles contrarios’. Estas são as principais afirmações, cidades hierárquicas e de mobilidade concentrada têm maior qualidade de vida e menos poluição, que chegaram os estudos da equipe multidisciplinar do Consejo Superior de Investigaciones Científicas (CSIC).
Para esta pesquisa, quanto `a mobilidade urbana, existem dois tipos extremos de formas, cidades que são como cebolas ou que são como cachos de uvas:’ por un lado, urbes que son como cebollas, por el otro, ciudades que funcionan como racimos de uvas’. Na Europa, afirmam, ‘la mayoría de las ciudades son cebollas: tienen centros compactos en los que los ciudadanos y turistas entran y salen mucho, rodeados de consiguientes capas en las que se va produciendo menos movimiento y menos densidad. Ao contrário, nos Estados Unidos, afirmam os pesquisadores, ‘abundan las ciudades que se parecen más a un racimo de uvas’. O paradigma deste tipo de cidade seria a região de Los Angeles onde : ‘muchos centros neurálgicos vibrando con movimiento, rodeados de zonas donde la gente se mueve menos’.
A discussão ate´ agora era definir que tipo de cidade seria a mais eficiente, e, ‘com este estudo descobrimos que a melhor e´ a concêntrica,’ diz Javier Ramasco, investigador del CSIC.
Será que estes resultados serviriam para pensar criticamente a atual situação da Grande Vitória, cuja forma se assemelha mais ao modelo de um cacho de uvas, dispersando no seu extenso território, múltiplos e desiguais centros e bairros, conectados por intervalos de baixa movimentação e atividades?
Já a algum tempo políticos e urbanistas , em todo o mundo, tem buscado, em várias cidades na América, Europa e no Canada’, reverter a dispersão urbana e a pluricentralidade, incentivando ações privadas e investindo em serviços, infraestrutura e lugares públicos, no sentido de fortalecer, qualificar e adensar os centros urbanos, históricos e comerciais, transformando-os em nós de cultura, educação, moradia, turismo e de negócios, pontos de mobilidade concentrada.
Enquanto isto, na Grande Vitória, nos deparamos com um centro histórico em frangalhos e aparentemente estamos conformados em viver em arquipélago urbano em que se transformou a nossa metrópole, de longos afastamentos, de longas distancias e de longos tempos de translação entre os seus muitos centros e as fragmentadas áreas habitacionais, impondo uma forte segregação urbana, custos e tempos elevados de transporte público e privado e uma ineficiente oferta de infraestrutura urbana e dos serviços pessoais e empresariais.
O estudo também mostra uma possível correlação entre compacidade de uma cidade e quanto ela e´ capaz e propícia para misturar e mesclar a sua população. Quanto mais hierárquica, mais centralizada, diz o estudo, e consequentemente, mais diversidade social: “La idea es que hay un lugar donde la gente de distintas zonas se encuentra”, e os centros urbanos são estes locais, informa a pesquisa.
Se há um futuro das cidades no século XXI, feliz, sustentável, igualitário e desenvolvido, ele será necessariamente vivido com menos circulação de carros privados nas zonas urbanas, mais movimentações a pé, em transportes públicos e em modais de baixos impactos, com centros concentrados, em habitação e trabalho, e dinâmicos, em educação e cultura, onde convivam as diversidades humanas em usos de todo o tipo, compartilhando espaços e ambientes públicos e democráticos

Kleber Frizzera
Outubro 2019


domingo, 20 de outubro de 2019

Montreal 2. Diversidade urbana



A diversidade social e´ atualmente uma das marcas distintivas de Montreal.
A cidade foi sendo construída por várias levas de imigrantes, franceses, ingleses, escoceses, irlandeses, de várias origens do leste europeu, e recentemente, de sírios, árabes, libaneses, haitianos e chineses que a compartilham com uma imensidão de estudantes, inclusive brasileiros, oriundos de todas as partes do mundo. 
Montreal aprendeu a conviver e respeitar as diferenças linguísticas e as multiculturalidades de seus moradores, além de revalorizar a história das primeiras nações, que ocupavam o território antes da chegada dos europeus. Hoje 40 % de sua população falam três idiomas, inglês e francês, línguas oficiais do Canada e mais uma língua de sua etnia ou nação, e 10 % falam quatro ou mais línguas.
A múltiplas diferenças étnicas e nacionais, e opções de sexualidades, práticas sociais e religiosas, movem um caldeirão de comportamentos que esta´ criando uma economia moderna e uma sociedade plural, onde a diversidade é uma das bases da igualdade e do desenvolvimento. 
Evidentemente não faltam resistências dos que se acham ameaçados em seus valores, mas a situação da economia, com alta oferta de empregos, acaba reduzindo a dimensão destes discursos xenófobos.
Enquanto isto, em alguns países, inclusive no Brasil, muitos se manifestam por uma sociedade desigual e subordinada a um único quadro de valores religiosos e familiares, condenando e discriminando as diferenças, de todos os tipos, e adotando uma pauta moral, atrasada e ineficiente nas competições internacionais da economia. 
No Brasil, vindo de autoridades públicas, estas afirmações acabam penetrando em todas as camadas sociais, incentivando os preconceitos e manifestações de ódios.
Evidentemente que em um país com muito menos desigualdades econômicas, como o Canada´, com reduzidos índices de violências, pode parecer mais fácil construir uma sociedade com uma convivência social mais colaborativa e solidária. Mas não basta nem e´ suficiente as suas vantagens econômicas, como o exemplo na manutenção de fortes preconceitos raciais e sociais, em um país rico como os Estados Unidos.
Uma das razões da diversidade vivida em Montreal inicia-se com um elevado investimento na educação superior e pesquisa instaladas, boa parte, no centro urbano. Hoje, milhares de estudantes estrangeiros mudam-se para Montreal para aprofundar seus estudos, contribuindo para uma grande presença de jovens de todas nacionalidades nos lugares públicos. Após os estudos, muitos permanecem, atraídos pelos empregos de alta tecnologia e pela qualidade de vida urbana
Canada´ e Montreal sempre acolheram refugiados políticos e econômicos de várias nações, desde irlandeses empobrecidos no século XIX e XX a sírios e árabes perseguidos no século XXI, e novos mecanismos de estímulos a investimentos, tem trazido um grande número de moradores asiáticos, principalmente chineses. 
Como professor e arquiteto tenho estudado se os aspectos físicos de uma cidade e os comportamentos públicos de seus moradores revelam e contribuem para partilhamento de uma experiência comum e para a convivência pacífica de uma diversidade social.
Mas seremos capazes de reconhecer estas qualidades nos usufrutos de lugares públicos e nas faces de suas construções?
Preliminarmente, nas poucas semanas que estou em Montreal, me surpreendo com a multiplicidade das vozes, gestos e vestimentas e com a extrema qualidade de seus lugares de uso comum, ruas, praças e parques, que se oferecem bela e generosamente ´a vida urbana.
Novos edifícios, convivendo com construções históricas, aumentam a densidade populacional e de serviços no centro, e junto com agradáveis e extensas praças e parques, parecem também potencializar novos usos e a presença de mais e diferentes pessoas nas vias públicas.

Reduzir as desigualdades e as segregações urbanas e sociais, investir fortemente na educação e na pesquisa, atrair jovens do mundo, respeitar as diferenças e qualificar os espaços urbanos, poderão contribuir para tornar a cidade da Grande Vitoria, mais diversa, feliz e igualitária?

Kleber Frizzera
Outubro 2019
publicado em movimentoonline.com.br

sábado, 12 de outubro de 2019

Montreal 1 Reinvenção urbana



27 de setembro de 2019
Centenas de milhares de pessoas, na maioria jovens, saem ´as ruas da cidade de Montreal, em uma massiva manifestação em defesa do planeta, exigindo ações imediatas no enfrentamento do aquecimento global e das mudanças climáticas.
Mais de 10% da população da região metropolitana de Montreal estiveram nesta manifestação.
Os cartazes são improvisados, feitos a mão pelos manifestantes, revelando uma pluralidade de expressões pessoais e posturas políticas, e um conjunto múltiplo de desejos e propostas, generosos e solidários.

Das 20 melhores cidades do mundo para morar, conforme QUALITY OF LIVING CITY RANKIG. 2019,quatro delas estão no Canada´, Vancouver, Toronto, Otawa e Montreal.

Montreal Metrópole, possui uma população em torno de 4 milhões de habitantes, fundada a 377 anos, se desenvolveu como cidade-porto. porto de transbordo, devido as corredeiras, no Rio São Lourenço, via de ligação entre o Atlântico e as férteis terras em torno dos grandes lagos. Margeando este rio e uma infinidade de canais de navegação e ferrovias, construídos no século XIX, foram implantadas inúmeras indústrias, que suportaram o grande crescimento econômico desta região dos Estados Unidos e do Canada´, ate´ as década de 1980\ 1990.
Nas últimas décadas do século XX, Montreal atravessou profundas crises, econômicas, pela desindustrialização, e devido a gestão fiscal, e precisou reinventar as suas bases produtivas para retomar o desenvolvimento econômico, urbano e social.
O resultado desta renovação pode ser observado nas infraestruturas públicas e ambientes urbanos- renovados, ampliados e nos investimentos imobiliários, para atender novos e jovens moradores, acomodar turistas e estudantes, e a locação de negócios mais diversificados, ligados aos novos dinamismos da economia mundial.
Do ponto de vista urbano, as principais ações foram as seguintes:
1.            Renovação de edifícios, galpões industriais e de áreas degradadas, localizadas nas margens dos rios e dos canais de navegação, próximas do centros urbano.
2.            Adensamento construtivo e populacional da área central, pela verticalização, redesenho de quadras e das legislações urbanas, incentivando os usos mistos e de pequena escala.
3.            Investimentos em qualificação de vias públicas, calçadas e parques, estimulando os deslocamentos a pé e de bicicleta e o usufruto cotidiano de lugares próximos das residências e dos trabalhos.
4.            Estímulo ao turismo e a cultura, preservação do patrimônio construído, proteção das paisagens naturais e implantação de novos equipamentos culturais e de entretenimento.
5.            Melhoria e ampliação do sistema de transporte público de massa e de outros meios de deslocamento individual.
6.            E o fortalecimento dos programas sociais, de inclusão social e econômico, de emprego e renda, acesso aos serviços públicos e respeito a´ diversidade étnica, cultural e social.

Podemos reconhecer os sinais visíveis destas ações, quando caminhamos na cidade de Montreal, observando;
1.            Uma alta densidade de pessoas nas ruas- jovens movimentando-se a pé e bicicleta-, e uma alta intensidade de ocupação de bares, ruas e parques, nos finais de tarde e finais de semana 
2.            A presença de grande número de novas construções expondo novas relações formais e estéticas com os elementos construídos, com a forma urbana tradicional e edifícios históricos
3.            A abertura de novas vistas e eixos de circulação, uma maior permeabilidade em áreas anteriormente fechadas, onde fábricas, armazéns e viadutos, eram obstáculos aos movimentos, aos acessos e os olhares dos pedestres.
4.            A presença pública das faces de múltiplas etnias e nacionalidades e da oferta de suas expressões culturais, como serviços e comércios especializados.
5.            A garantia de segurança pessoal na experiência urbana, nas relações humanas entre os corpos e pessoas nos espaços de uso comum.
Montreal e´ uma cidade metrópole completa.
Completa pelo direito ´a manifestações, políticas, ambientais, ´a segurança na vida urbana, oferecendo lugares belos, praças e parques atraentes, convidativos aos passeios, aos encontros, aos exercícios, as caminhadas.
Também como uma metrópole completa, em Montreal se partilha o passado, seus sítios históricos, suas paisagens e seus edifícios restaurados.
De suas muitas diversidades, se faz também uma metrópole, na convivência de tantas caras, origens, sexualidades, tantos corpos e vestimentas diferentes, das muitas falas e línguas que ocupam os ares, movem as conversas e as narrativas.
A Grande Vitória conseguira´ ser um dia uma metrópole completa?

Kleber Frizzera
Outubro 2019
Publicado em movimentoonline.com.br
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