Os armazéns
do IBC
O
extraordinário do cotidiano e’ superar o próprio cotidiano
Henri
Lebfreve
Um poeta
alemão, no século XIX, nos alertou:
Onde mora
o perigo, também mora a salvação.
As cidades,
suas construções, bairros, eventos e pessoas, se transformam com o tempo.
Vitória e Jardim da Penha não são diferentes. Frutos, seus desenvolvimentos,
nos últimos cinquenta anos, da expansão do projeto industrial/ portuário de
Tubarão, da instalação da UFES, e deslocamento da população para o continente,
encontram-se, agora, cidade e bairro, em um impasse, em um limite, diante do
covid 19, mas também das conjunturas sociais e econômicas, que se alteraram profundamente
nos últimos anos.
De um
lado, o bairro não mais recebe um excedente de população, jovem e migrante, que
lhe injetou, durante décadas, animação, vida coletiva e modernidade, e antes, percebe-se
um consequente envelhecimento populacional.
De outro
lado, a inevitável redução da importância do projeto exportador impõe `a cidade
e aos seus moradores, um esforço de invenção de um projeto alternativo econômico,
que garanta e seja o suporte de um futuro próspero, com uma necessária
distribuição efetiva da riqueza e dos acessos aos bens públicos.
O que
isto tem a ver com os galpões do IBC?
Erguido a
mais de cinquenta anos para abrigar o estoque regulador do café’, com o tempo
foi perdendo a sua função original, restando, semi ocupado, imenso obstáculo no
centro do bairro, uma sequência de muros reservando, no interior, um passado
esgotado, uma imensa caixa vazia.
Nos
momentos de grande aflição e riscos coletivos, como vivemos agora, uma pandemia
mundial que não respeita fronteiras e limites, brilham possibilidades de
renovação e salvação.
Mas
também, aumentam os riscos do atraso, da expansão do conservadorismo, da
ignorância e dos preconceitos sociais e raciais.
Estamos
diante destes perigos e potencialidades,
O debate
e a decisão acerca de novos usos dos galpões, trata-se de uma destas
potencialidades. Uma área de mais de 30.000 m2, central ao bairro e de acesso
fácil às avenidas, que articulam a metrópole norte. Uma oportunidade excepcional
para a cidade, para uma renovação de Jardim da Penha e para o futuro de nossas
crianças e jovens.
Não
podemos entregar esta chance `a decisão dos interesses do governo federal, da
gula do mercado imobiliário, que ainda não se aperceberam dos novos tempos pós
pandemia, e não compreendem as novas demandas urbanas emergentes.
Cabe a
nós, moradores, da cidade e do bairro, trabalhadores, estudantes e
frequentadores de suas ruas, principalmente os mais jovens, atrevermos a
pensar, propor e decidir mais nobres utilizações para a área, através de um
amplo debate democrático.
Um projeto cultural
Não é por acaso, ou por desconhecimento, que a palavra cultura
e a consequente instalação de um local adequado para a sua produção e usufruto,
destacando a sua importância e valor, seja a primeira a ser lembrada no atual debate.
Mesmo aos mais resistentes, está claro que qualquer projeto de futuro, passa
pela produção coletiva do saber imaterial, das ciências, das tecnologias e das
artes, através da inovação criativa, forma de participar ativamente em um mundo
em permanentemente mudança.
Cultura, neste caso, não se restringe às atividades
artísticas, mas se refere a todas as práticas sociais, vividas na vida privada
ou comum, no aprendizado contínuo, na pesquisa, básica e aplicada, na criação
de novos procedimentos e aplicativos, na descoberta de conteúdos informativos
ou significados artísticos, para uma apropriação e uso público, e que promovam
uma economia de bens simbólicos, inclusiva e sustentável.
Como um produto coletivo, a produção cultural deve abrigar os
mais diferentes modos de representação e significação, de classe, gênero, raça
ou sexo, deve servir para dar visibilidade e presença `as minorias e `as
parcelas excluídas da sociedade, como parte da redução das desigualdades
urbanas e econômicas.
A proximidade da UFES, o interesse do IFES e da Secretaria de
Cultura do Estado, e principalmente, as movimentações da população de Jardim da
Penha, já’ garantem o impulso inicial partida deste debate, e, tenho algumas
propostas, baseadas nos seguintes princípios e objetivos:
Centro de produção cultural
Objetivos gerais
Agregar/ articular/ aproximar atividades múltiplas de
aprendizado, conhecimento e produção de conteúdos e fruição de experiências
artísticas, cientificas, esportivas e culturais, a partir dos seguintes
princípios:
1.
Um lugar feito para aproximar pessoas/ ideias/
informações, um local de troca de afetos, contatos e conhecimentos.
2.
Um lugar de produção e consumo de inovações, onde
se agreguem moradias temporárias, um local de pontos múltiplos de sociabilidade.
3.
Um lugar permeável, onde se instale a diversidade,
diferenças, um local dos conflitos e da negociação, entre o bairro, a metrópole
e o mundo.
E com o
seguinte programa mínimo de atividades:
1.
Moradias temporárias/
Que possa abrigar residências artísticas/ estudantes/ para
manter uma movimentação constante de pessoas jovens.
2.
Oficinas de formação/ aperfeiçoamento e
treinamento-
Instalação de um centro de extensão universitária/ Ufes/ Ifes/Secult
3.
Locais de apresentação/ fruição artística-
Equipamentos culturais. teatro/ auditório/ salas de
exposições/ cinema, etc.
4.
Praça pública/ de encontros/ de
manifestações/
Feira livre/ feirinhas semanais e festas comunitárias
5.
Comércio e serviços locais-
Para a instalação de pequenas lojas/ escritórios, bares e
restaurantes, artesanato, etc.
6.
Biblioteca, arquivo, e museu histórico-
Que guarde e proteja as memórias de imagens e sons da cidade
de Vitoria/ Jardim da Penha
7.
Centro de apoio e instalação a novos negócios/ Para as
start ups tecnológicas/ artísticas/ sociais
8.
Instalações exercícios físicos-
Tais como academia/ piscina/quadra/etc.
Para o bom
funcionamento do centro, propomos uma
Administração
e gestão colegiada,
Com a
participação de:
1.
Moradores Jardim da penha/ Cidade
2.
Prefeitura
3.
Secult/ governo do Estado/Ifes/Ufes
4.
Produtores culturais/ científicos
Os tempos de pandemia nos cobram ousadias, nos exigem desejos,
nos alimentam de esperança de melhores dias.
A ocupação criativa do galpões do IBC e’ uma aposta que
precisamos fazer.
Kleber Frizzera
Julho/2020